
INCLUIR, CUIDAR E PROTEGER
A exposição virtual “Portas Abertas para Direitos” é um convite à memória desse caminho e ao avanço do caminhar.
Aqui você poderá visualizar como as políticas de desenvolvimento e assistência social se estruturaram em pouco mais de duas décadas. O fio condutor para narrar essa trajetória é o Cadastro Único, porta de entrada para mais de 40 milhões de famílias vulneráveis de grande parte dos programas sociais em todo o território nacional.
A criação do MDS, em 2004, foi uma verdadeira quebra de paradigma na condução das políticas de enfrentamento da fome e da pobreza no País. O Cadastro Único é o responsável por organizar essa vasta rede de informações que orientam a proteção social. Desde sua criação, em 2001, ele passou por muitas reformulações, se tornando uma moderna, ágil e eficiente ferramenta de caracterização de famílias de baixa renda e de direcionamento de políticas públicas. Foi um longo percurso e essa trilha de inovações desemboca em 2025, com o lançamento do Novo Cadastro Único.
Mais que um convite à memória, as histórias aqui compartilhadas nos levam a refletir sobre essa construção e o futuro que queremos: um Brasil com políticas públicas sólidas que permitam a superação da pobreza e a redução das desigualdades em que possamos, todas e todos, viver com dignidade.
5 histórias de acesso a direitos



AM
Na RESEX do Lago do Capanã Grande (AM), uma tecnologia social leva saneamento e água num contexto de mudanças climáticas


DF
Em Brasília e no Sol Nascente (DF), o Bolsa Família permite a beneficiárias sonhar


MA
Em quilombos de Alcântara (MA), o acesso à segurança alimentar anda junto com o fortalecimento da agricultura familiar


MG
Em Belo Horizonte (MG), portas abertas para a inclusão de pessoas em situação de rua


RS
No Rio Grande do Sul, uma força-tarefa garantiu às vítimas das enchentes de 2024 uma oportunidade para recomeçar
10 cadastros, 10 vidas
Cada uma das mais de 93 milhões de pessoas no Cadastro Único tem sonhos e trajetórias. Deslize e conheça algumas delas

10 cadastros, 10 vidas
Cada uma das mais de 93 milhões de pessoas no Cadastro Único tem sonhos e trajetórias. Deslize e conheça algumas delas
Sarah
foi beneficiária do Bolsa Família e hoje cursa medicina e estagia na gestão federal do Cadastro Único, no MDS, em Brasília (DF)
Conheça sua história

Rosilda
agora tem água para lavar os alimentos e dar banho em seus filhos, na RESEX do Lago do Capanã Grande (AM)
Conheça sua históriaJuracir
fez curso profissionalizante e aulas de artesanato com apoio do Centro POP em Belo Horizonte (MG)
Conheça sua história

Lourença
é liderança quilombola no Maranhão e produz alimentos orgânicos para o PNAE
Conheça sua históriaAna Cláudia
foi vítima das enchentes em Alvorada (RS) mas encontrou apoio e proteção no CRAS
Conheça sua história

Rodrigo
já esteve no Cadastro Único e hoje é cadastrador no CRAS Sol Nascente (DF)
Conheça sua história

Beatriz
é venezuelana, vive no Rio Grande do Sul e após ser atingida pelas enchentes recebeu Auxílio Reconstrução
Conheça sua históriaMaria Angélica
com a chegada do Programa Cisternas no Amazonas, agora tem água limpa para beber e cozinhar
Conheça sua história

Sarah
A camiseta estampa, com orgulho, a faculdade de Medicina cursada por Sarah Rocha Margittay na Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), no Distrito Federal (DF). O caminho até ali não foi nada fácil: da infância vivida nas cidades satélites do DF e no Tocantins, recorda bem a alegria do dia em que a família recebia cesta básica do CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social): “Quando chegava a cesta básica, era muito bom. Eu sabia que a gente ia comer direitinho. Não tinha que dormir pensando no que a gente ia comer no outro dia”.
Sarah cursou tanto o ensino fundamental quanto o médio em escolas públicas. Era uma aluna de destaque, especialmente em Matemática – chegou a ganhar premiações na área. Ainda assim, tinha dúvidas sobre o futuro: sabia que não poderia participar do “tourvest”, quando candidatos viajam Brasil afora para realizar diversos vestibulares em diferentes estados; então, restavam-lhe poucas alternativas. “Os vestibulandos viajam o Brasil inteiro para tentar vagas em outros estados. Só que eu não tinha dinheiro nem para pagar os vestibulares daqui [no DF], quanto mais gastar dinheiro com passagem para prestar vestibular de outras instituições. Então o único vestibular que eu prestei foi o ENEM”. Com o seu Número de Identificação Social (NIS), vinculado ao Cadastro Único, Sarah recebeu isenção nas taxas do exame nacional. “Eu só consegui prestar o ENEM por causa do Cadastro Único. Com a nota do ENEM, apliquei no SISU e, entre as opções que passei, escolhi a ESCS”.
Rosilda
Saindo de Manaus, são 16 horas em lancha até Manicoré, seguindo pelo Rio Madeira. Dali, ainda leva duas horas de voadeira, até chegar ao Igarapé Capanã. E aí sim: bem fundo na Amazônia, onde o horizonte é todo verde, no entorno de um lago grande e bonito – embora seco, mais seco do que jamais esteve –, chega-se a uma pequena casa de madeira. Em frente à porta, está Rosilda Cordeiro Leite, 41 anos, feliz e ansiosa para mostrar as melhorias em sua moradia: em agosto de 2024, foi instalado ali um Sistema Pluvial Multiuso Autônomo, sistema domiciliar de captação e reserva de água de chuva, uma das tecnologias integradas ao Programa Cisternas. Agora, Rosilda e família têm acesso à pia para lavar alimentos; a louça suja já não acumula; as crianças já não sofrem com os frequentes problemas intestinais; tem chuveiro para tomar banho e vaso sanitário com descarga e fossa; além de água para irrigar a plantação de subsistência – macaxeira e banana, principalmente.
“Ajudou muito. Quando a gente chegava do trabalho, tinha que ir até o porto, pegar água para tomar banho. Meus filhos iam para a escola de manhã e tinham que tomar banho na beira [do lago]. Hoje em dia, não: eles já tomam banho em casa. Tem bastante água”, comemora Rosilda.
Juracir
Uma mão estendida. Assim Juracir de Almeida Nascimento, 49 anos, resume o significado do Centro de Referência Especializado para Pessoas em Situação de Rua, conhecido como Centro POP. Morador de Belo Horizonte, Minas Gerais, ele passou por momentos difíceis em sua vida, que acabaram o levando à situação de rua. Por todas essas cicatrizes, hoje tem o semblante sério, mesmo quando expressa sua gratidão aos assistentes sociais que o acolheram: “Eu venho aqui no POP, se precisar de um documento, o pessoal nos apoia, nos acolhe. Café da manhã, banho, roupa, quando a gente precisa, tem. E nem é só isso: se tem um lugar para ir, precisa de um vale-transporte, alguma coisa, o que tiver ao alcance deles, eles estão aqui para nos ajudar”.
Juracir experienciou na pele a necessidade dessa ajuda, em diferentes ocasiões. Uma vez, ao dormir em uma praça, teve a carteira roubada, com todos os documentos dentro dela. Foi até o Centro POP, onde encontrou orientação para refazê-los. Ali também conseguiu se inscrever no Cadastro Único, porta de acesso às políticas sociais brasileiras, e agora recebe o Bolsa Família. Com o auxílio, consegue comprar roupas e alimentos.
Lourença
Turun tun tá, turun tun tá, turun tun tá. De longe, parece uma máquina – turun tun tá, turun tun tá, turun tun tá. Seguindo o som, porém, vê-se, nos fundos de uma casa, que o ritmo vem dos pilões, empunhados por quatro mulheres que se intercalam de maneira ritmada para amassar a mamona, que tempo depois viraria óleo. A cena é comum por ali, no Quilombo Mamuna, em Alcântara, no Maranhão.
Duas das mãos que trabalham harmonicamente são de Lourença Vieira Moraes, há 23 anos moradora do quilombo. O local, historicamente, sofre com ameaças de remoção, para a expansão do Centro Espacial de Alcântara, instalado na região nos anos 1980. Parte dos vizinhos de Lourença foram despejados e levados até áreas mais distantes; lá, porém, não se consegue um bom cultivo. “Quando houve a instalação dessa base, eles não pensaram nas comunidades que habitavam dentro desses territórios, que desde que nasceram estavam ali”.
Ana Cláudia
“Já pensou? 3h da manhã tu acordar com a água pelo pescoço dentro de casa? Isso não é vida. E tu perder toda a tua história ali dentro…”. Ana Cláudia da Silva, moradora de Alvorada, município vizinho a Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, contou ter vivido um filme de terror durante as enchentes históricas de maio de 2024. Ela, sua filha, seus dois filhos autistas, as doze sobrinhas – uma delas grávida –, as duas irmãs e a mãe precisaram ser realocadas porque as três casas onde vivem foram invadidas pelas águas. “Na rua onde eu moro, não tem boca de lobo. A água começou a entrar pelo banheiro. Entrou pelo banheiro, pelo ralo da cozinha e pela fossa. Quando vi, já estava subindo”.
Nesse momento de desespero, Ana Cláudia diz ter encontrado no Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) uma ilha em meio ao tsunami – um lugar para refúgio e ajuda. “Ainda bem que tinha o posto aberto para ajudar a gente”. Ali, ela conseguiu apoio material, como doações de comida e cobertores – ou, no mínimo, encaminhamento para locais que estivessem fazendo entregas – e ajuda para acessar direitos naquele momento de emergência. Por exemplo, a equipe do CRAS a ajudou no preenchimento do formulário de solicitação do Auxílio Reconstrução, apoio financeiro de R$ 5.100 pago pelo Governo Federal às famílias desabrigadas no Rio Grande do Sul. A crise climática, que atinge especialmente as famílias mais pobres, exigirá cada vez mais das políticas de assistência social, que precisam ser robustas.
Rodrigo
A cerca de 35 quilômetros de Brasília, está o Sol Nascente, comunidade que, desde 2023, é considerada a maior favela do Brasil em número de domicílios. São 32.081 domicílios, um crescimento de 31% em relação a 2010. É ali, no CRAS Sol Nascente, que o assistente social Rodrigo Afonso trabalha, junto a uma das populações mais vulneráveis do País. Mas ele afirma não estar ali para ajudar – é mais que isso: “Eles vêm procurando ajuda. A gente explica que o CRAS não oferece ajuda. Isso é política pública, é um direito”. Assim ele define a sua filosofia de assistência social: não se trata de querer ajudar, somente, mas sim de contribuir com a vida dos outros: “Mostrar para a pessoa que é um direito dela”.
Como se trata de uma região muito empobrecida do Distrito Federal, Rodrigo diz que boa parte da comunidade local passa pelo CRAS, por um motivo ou outro. Entre o público, muitas mães solteiras e pessoas idosas, que buscam não só o Bolsa Família, o Auxílio Gás ou o Benefício de Prestação Continuada (BPC) – uma série de outros benefícios também estão vinculados ao Cadastro Único, processo que é realizado no CRAS. “Uns 80%, quase 90% da população [da região] passa pelo Cadastro Único. Tarifa social de energia elétrica, depende do Cadastro Único; a Carteira do Idoso, depende do Cadastro Único; muitos programas dependem do Cadastro Único hoje”. Por isso, afirma Rodrigo, trata-se de fato de uma porta de entrada: “Nós costumamos falar que é a porta de entrada, o Cadastro Único. A porta de entrada para vários outros benefícios. A pessoa, assim que ela é assistida a primeira vez, o primeiro contato que nós temos com ela, em sequência ela faz o Cadastro Único. Dali para frente, a gente fala para ela: ‘A sua vida vai mudar’”.
Maria José
Entre uma pilha e outra de melancias, Maria José Lima Pinheiro aproveita para descansar um pouco, depois de um dia inteiro pesando e carregando as frutas em carrinhos de mão e em sacos. Ao todo, foram 450 melancias colhidas. Considerando que cada uma tem, em média, dez quilos, foram 4,5 toneladas que ela e o marido, Raimundo Francimar Mendes, movimentaram em sua plantação – e isso tudo em um único dia.
Apesar do cansaço, ela sorri, satisfeita, pois sabe o destino que as frutas terão: logo, todas as escolas da região as receberão, em dia de festa. Ela recorda a última vez que elas foram distribuídas: “Foi uma festa só. As crianças começaram a gritar que tinha chegado melancia. Além de a gente colocar um produto de qualidade, saudável, orgânico, a gente fica feliz sabendo que as crianças vão ter uma alimentação, uma fruta na escola para se alimentar. É gratificante. É árduo, é sofrido, mas é gratificante no final”.
Beatriz
6,5 mil quilômetros separam Barcelona, no norte da Venezuela, de Porto Alegre, no sul do Brasil. Foi essa a distância percorrida por Beatriz Del Carmen Sifontes, junto aos filhos, em busca de melhores condições de vida. Após passar por um abrigo em Roraima e ser recepcionada pela Operação Acolhida, foi a Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, por indicação de uma sobrinha, que já vivia lá. Na cidade, encontrou acolhimento, tanto das pessoas quanto dos equipamentos do Estado: “Me sinto muito agradecida por ter sido acolhida dessa maneira. Sinto que, mesmo tendo nacionalidade venezuelana, me atendem igual, como uma brasileira. Não vi discriminação”.
Beatriz se refere ao atendimento na unidade do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) em Alvorada, cidade vizinha a Porto Alegre, onde se instalou em uma pequena casa de madeira. De início, causou-lhe surpresa a existência de um lugar como esse, cujos serviços não distinguiam as pessoas por origem nacional, mas por necessidade. Ali, obteve informações sobre como emitir documentos e acessar benefícios, além de orientações sobre como matricular os filhos em escolas da região, garantindo que não perdessem o ano letivo. “Me sinto bem quando venho no CRAS, me dão o atendimento necessário”, conta.
Maria Angélica
Para ir buscar água, o melhor era ir cedo, antes do sol estar alto. Faz muito calor. No período seco, tinha que se caminhar ainda mais longe; a margem se mudava lá para adiante. E tudo isso que se andava indo, tinha que voltar depois – já com os baldes cheios d’água. Não era uma rotina fácil, mas era assim o dia a dia de Maria Angélica Doce Pereira, 30 anos, moradora há quatro anos da comunidade São Raimundo, na Reserva Extrativista do Lago do Capanã Grande, no Amazonas. A mesma rotina se repetia para muitas das mulheres da região: “Antes a gente lavava vasilhas e a louça tudo lá embaixo. Com a seca, ficou muito longe o rio. Seria mais trabalhoso ter que ir. Até devido ao calor, ao sol, as pessoas precisam fazer as coisas cedo”.
Mas isso mudou quando foi instalado, no centro da pequena comunidade, perto da escola e do campo de futebol, o Sistema Pluvial Multiuso Comunitário, uma das tecnologias de captação e tratamento de água do Programa Cisternas. Com ele, a água chega agora até as torneiras das casas, nas cozinhas e nos banheiros. “Isso facilita muito a vida, principalmente da gente que trabalha em casa. A gente lava louça, a gente pega para fazer comida, que é uma água tratada. A gente lava roupa... É multiuso, tudo que a gente vai fazer que precisa de água a gente utiliza a do sistema”, completa Maria Angélica.
Milene
Em duas horas, a água já havia subido “meia parede”. Em pouco tempo, Milene da Silva, 27 anos, que mora no segundo piso de uma casa, logo acima da residência de sua mãe, percebeu que a saída pelo térreo seria impossível. Sobrava uma alternativa: escapar pelo telhado. Assim, ela, seu filho e a mãe aguardaram para serem resgatadas – um drama similar ao de diversas famílias gaúchas atingidas pelas enchentes históricas de maio de 2024.
Milene trabalha no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) em Porto Alegre, como cadastradora do Cadastro Único. Cabe a ela incluir pessoas em vulnerabilidade, por meio do sistema, em uma vasta rede de políticas públicas. Portanto, apesar de ser uma das atingidas pela tragédia e ter ficado sem casa, em menos de um mês voltou ao batente – era o que a situação demandava: “Eu fiquei 29 dias em um abrigo, sem trabalhar. Dali eu consegui ir para uma casa de parentes, que foi cedida. Fiquei duas semanas lá. Trabalhei no CRAS da Lomba do Pinheiro, com o Cadastro Único – não deixei de trabalhar, de ajudar as pessoas. Era muito movimento. Depois passei a trabalhar aqui, na frente do CRAS, em barracas da Prefeitura. Trabalhei em ônibus da Defensoria Pública, trabalhei em um CTG [Centro de Tradições Gaúchas, que virou ponto de apoio]”, relata.