Lourença

Lourença

Turun tun tá, turun tun tá, turun tun tá. De longe, parece uma máquina – turun tun tá, turun tun tá, turun tun tá. Seguindo o som, porém, vê-se, nos fundos de uma casa, que o ritmo vem dos pilões, empunhados por quatro mulheres que se intercalam de maneira ritmada para amassar a mamona, que tempo depois viraria óleo. A cena é comum por ali, no Quilombo Mamuna, em Alcântara, no Maranhão.

Duas das mãos que trabalham harmonicamente são de Lourença Vieira Moraes, há 23 anos moradora do quilombo. O local, historicamente, sofre com ameaças de remoção, para a expansão do Centro Espacial de Alcântara, instalado na região nos anos 1980. Parte dos vizinhos de Lourença foram despejados e levados até áreas mais distantes; lá, porém, não se consegue um bom cultivo. “Quando houve a instalação dessa base, eles não pensaram nas comunidades que habitavam dentro desses territórios, que desde que nasceram estavam ali”.

Por pouco, o Quilombo Mamuna não sofreu destino igual, mas, em 2024, foi garantida a titulação do Território Quilombola de Alcântara. Ficando onde está, Mamuna funciona como “porta de entrada” para essas outras comunidades voltarem a seus territórios de origem e terem acesso a sua ancestralidade. Mais que isso, Lourença diz que a porta aberta é para a resistência – mesmo estando geograficamente mais distantes, a relação de vizinhança segue: “Por isso a nossa resistência teve mais força”, relata.

Hoje, ela comemora as melhorias no território e as políticas públicas que criam incentivos para o desenvolvimento local. Lourença é uma das agricultoras familiares que planta para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE); é seu primeiro ano vinculada ao programa. E logo estará também produzindo para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). “É um incentivo muito grande, tanto para nós, adultos, quanto para os jovens, para as crianças, porque eles vão se interessando e já vão procurando seguir uma profissão que esteja ligada à agricultura”.

Estar no ciclo produtivo de uma alimentação saudável é motivo de orgulho para ela: “Eu chego na minha horta, vou molhar os pés de alface e fico pensando: ‘Meu Deus, eu estou produzindo esse alimento aqui e ele vai para uma escola, para um hospital. Vai alimentar pessoas que nem me conhecem. Vai ser muito importante isso que eu estou produzindo aqui’. Eu tenho um cuidado muito grande. Eu não gosto de usar produtos [químicos], porque eu sei que vai servir tanto para a minha alimentação quanto para a dos outros. É muito gratificante saber que, das minhas mãos, do cultivo e do manejo que estou tendo ali, aquilo vai trazer saúde e benefícios para outras pessoas, não somente para mim”.